Eu estava passando perto de uma loja de bolsas naquele dia. Não sei o motivo, mas do nada mudei minha rota. Nunca passo ali
perto. Não tenho nenhum problema, contudo, felizmente ou infelizmente, sou meio
metódico em meu percurso. Devia ser diferente. Eu que sou tão afeito a quebrar
regras, a ousar, a tentar o novo, tenho ilhas de conservadorismo dentro de mim.
Uma senhora, por volta do seus 50
anos, me aborda na rua. Pensei que era para entregar alguma propaganda de plano
dental ou algum folheto de proselitismo religioso. Ela, calma, me perguntou o que
eu estava achando do dia. Era por volta de 16:30, estava saindo do trabalho e
queria, mais que tudo nesse mundo, pegar o ônibus, que nesse horário é sempre
lotado, e ir para minha casa.
Respondi que estava cansado, um
pouco estressado, suado e queria logo chegar em casa, preparar algo para comer
e depois ir para a academia. A todo tempo eu ficava olhando para o início da
avenida com a expectativa do coletivo chegar.
Ela me disse que perguntou o que
eu estava achando do dia e não de como eu estava. Meio que não entendi direito.
Ela apontou o céu. Estava perto do ocaso. Lindo. Eu falei que mal tinha
reparado no espaço ao meu redor. Acordei cedo. Peguei um transporte hiper
lotado pela manhã, tinha dado aula pela manhã, almoçado em um restaurante
popular, dado aula a tarde e que minhas observações daquele dia estavam apenas
relacionadas ao trabalho e meu desejo de chegar em casa. Logo em seguida ela
foi embora. Nem deu tempo direito para eu dizer até logo.
Nunca a tinha visto. Acho que
dificilmente tornarei a vê-la novamente. Aquela pergunta dela ficou martelando
em minha cabeça. Parei e fiquei olhando o céu, a praça perto do mercado, as plantas
naquele ambiente, vendedores nas lojas, pessoas indo e vindo em todas as
direções. De repente, aquilo que muito me exasperava começou a ter sentido para
mim. Meu acordar cedo, minhas aulas ministradas, meu almoço simples, tudo
aquilo começou a fazer parte de uma sinfonia tocada na orquestra da vida. Cada
peça encaixa perfeitamente no quebra cabeça do universo.
Vez em quando, nos instantes que
o cotidiano parece querer me sufocar eu paro e olho ao meu redor. Não para
ver quem sofre mais do que eu. Tem gente que se sente agradecido por não ser
tão pobre ou miserável quanto o outro. Olho ao meu redor para sentir o
movimento da vida. Olho para sentir a minha dependência das outras pessoas. Somos
parte de um todo. Preciso do gari que varre a rua tanto quanto do médico que me
atende e trata de algum problema de saúde meu.
Agradeço muito aquela mulher que durante
mais ou menos dois minutos me fez ver o outro lado da coisa. Sempre tem o outro
lado. Uma vez um amigo me disse que um fio positivo e o negativo juntos geram a
energia que move a vida de hoje. Nada é totalmente bom ou totalmente ruim. Cara e coroa constituem a mesma moeda.
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